Confira como foi o Seminário Nacional de Serviço Social e Direitos Humanos

Conselheiras do CRESS/PR relatam os principais debates do evento

109_1351Entre os dias 4 e 6 de setembro aconteceu em Palmas (TO) o Seminário Nacional de Serviço Social e Direitos humanos, abordando o tema “No mundo de desigualdade, toda violação de direitos é violência”. O CRESS/PR participou do evento, representado pelas conselheiras Daraci Rosa dos Santos, Renária Moura, Adriana Matias e pela assistente social Emanuelle Pereira, representando a base, que relatam abaixo os principais pontos discutindo durante o encontro.

Durante os três dias de seminário foram debatidos temas como a relação dos Direitos Humanos com o projeto ético político do profissional, em quais aspectos a categoria deve avançar e resistir coletivamente, como está os direitos no Brasil hoje, o que já foi conquistado, os próximos desafios e o que há de políticas sociais no país.

Confira abaixo o relato elaborado pelas representantes do CRESS/PR no Seminário.

4/09

Abertura do Encontro

O evento teve sua abertura explanando algumas questões com os participantes. Entre elas foram: Qual a concepção de direitos humanos que queremos? Em que aspectos devemos avançar e quais resistências coletivas precisamos fortalecer? A partir destas provocações, iniciaram os debates com os representantes do CFESS, CRESS-TO, ABEPSS e ENESSO.

109_1355Após a mesa de abertura foi realizada uma atividade cultural com a participação do grupo regional Cafundó do Brejo, que, por meio da quadrilha, tematizou o trabalho infantil como violação dos direitos humanos da criança e do adolescente. Em sua apresentação trouxe palavras de ordem, trechos do ECA e a importância do brincar na infância.

Conferência: Direitos humanos, sociabilidade e projeto ético-político

Pela noite o seminário prosseguiu com a conferência “Direitos Humanos, sociabilidade e projeto ético-político”. Ambas as expositoras (Maria Lucia Barroco e Silvana Mara Morais dos Santos), apresentaram falas orientadas pela concepção ontológica e histórica dos direitos humanos. Assim como também trouxeram em suas exposições, a permanente necessidade de compreendermos as expressões de desrespeito aos DH na sociedade contemporânea. Sociedade esta, que tem na sua gênese, a reafirmação do direito a propriedade privada e a desregulamentação de direitos conquistados e adquiridos pela classe trabalhadora.

CFESS3Silvana Mara encerra sua fala afirmando que, pautar de forma permanente no âmbito do conjunto CFESS/CRESS o debate acerca dos DH, na perspectiva critica, é uma insistente luta a qual estamos dispostos a realizar.

Na qualidade de debatedor, o assistente social Jefferson Lee de Souza Ruiz lança uma provocação à categoria. O mesmo lembra que, sendo o Estado o maior empregador de assistentes sociais, precisamos ficar atentos e vigilantes, para não pactuarmos com políticas e práticas que acabam se desdobrando em desrespeito aos DH.

5/09

Plenária: Direitos humanos nas políticas sociais

Nesta plenária se discutiu sobre “Direitos humanos nas políticas sociais” sendo exposta por Maurílio Castro de Matos – assistente social, professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), conselheiro do CFESS e por Guilherme Almeida – assistente social e professor da UERJ

Maurílio abordou em sua fala que “os Direitos Humanos surgem a partir do tencionamento de pessoas que lutam por acesso a direitos, bem como as violações que historicamente foram cometidas às pessoas e nações que ousaram a questionar a ordem opressora vigente. Direitos são frutos de lutas de classe, concepções de conquistas” comentou o professor. O palestrante abordou ainda sobre os limites e possibilidades da atuação dos/as assistentes sociais na afirmação dos direitos humanos, no contexto das políticas sociais brasileiras.

Guilherme Almeida falou a respeito das contribuições dos/as assistentes sociais na afirmação dos direitos humanos da população LGBT. Trazendo grandes contribuições a cerca desta temática. Uma das participantes da plenária resgatou o histórico de ações do Conjunto CFESS-CRESS no combate à homofobia. Ela citou a campanha “O amor fala todas as línguas”, de 2006, como marco dessa luta, que vem tendo uma série de desdobramentos, como aprovação da resolução 489/2006, que vedam práticas discriminatórias ou preconceituosas de assistentes sociais por orientação e expressão sexual por pessoas do mesmo sexo.

Na oportunidade também foi ressaltado as lutas que o Conjunto vem participando, como nas marchas contra a homofobia, a adoção do manual de comunicação LGBT, e, mais recentemente, a Resolução 615/2011, que permite à assistente social travesti e ao/à transexual a utilização do nome social na carteira e na cédula de identidade profissional.

Plenária: As particularidades da atuação do/a assistente social nos processos de desapropriações, remoções e despejos

CFESS1Esta plenária abordou “As particularidades da atuação do/a assistente social nos processos de desapropriações, remoções e despejos”. Eloisa Gabriel dos Santos (SP), que foi uma das expositoras da temática, comentou sob a ótica do direito à moradia enquanto um direito humano, conceituando as duas categorias que nortearam o debate: ‘moradia adequada’ e ‘despejo’. Para tanto, a mesma se respaldou em marcos legal nacional, tais como Estatuto da Cidade, Estatuto da Terra, Código Florestal, Estatuto do Índio, lei federal que regulamenta a regularização fundiária, portarias e resoluções. Eloisa também se referenciou em tratados e acordos internacionais da ONU, os quais o Brasil é signatário.

Já a assistente social e diretora de projetos sociais da Secretaria de Habitação do Estado do Tocantins, Jocelaine Lago Dalanora, trouxe um panorama da questão urbana vivenciada no estado do Tocantins. O qual, se expressa em meio ao desrespeito aos direitos humanos, decorrentes de áreas atingidas por hidroelétricas, barragens e ferrovia.

A assistente social Tânia Maria Ramos de Godoi (SP) e professora da UNIFESP, ampliou a debate para as dimensões urbana e rural. Como representante do CFESS no Fórum Nacional de Reforma Urbana, a mesma trouxe posições defendidas, as quais contemplam o direito à moradia não vinculado exclusivamente a casa, mas na perspectiva da transversalidade das políticas públicas. Para Tânia o direito à moradia na cidade e no campo, deve preservar o exercício pleno da cidadania, assim como a gestão democrática das cidades e do campo. O direito a cidade não pode ser pensado apenas sob a ótica do que está disponível, mas na sua ampliação.

Plenária: A participação do/a assistente social nos processos de internação/abrigamento compulsórios

A professora da Universidade Federal do Piauí, Lúcia Cristina dos Santos Rosa, iniciou sua fala problematizando a questão do álcool como uma droga lícita que acaba por gerar mais problemas e acidentes entre os jovens. Existem vários padrões de uso e tipos de substâncias psicoativas. O próprio crack vem tendo usuários/as de momentos recreativos que não chegam à dependência, como diversos usuários/as recreativos/as de maconha, cocaína e metanfetaminas, que aproveitam momentos festivos, feriados e carnavais para fazerem uso de drogas. Nesse sentido, a política mercadológica por trás da cultura que nas festas deve haver uso de bebidas alcoólicas é patrocinada pelas empresas de cerveja como nos carnavais.

A Lei 10.216 tem grande relevância porque reconhece os dependentes químicos como pacientes de saúde mental, porém também considera efetiva a internação compulsória. Nesse sentido entendemos que essa lei contraria o projeto ético-político do Serviço Social, o Código de Ética do Assistente Social e, por conseguinte, a Constituição Federal de 1988.

Se for executado o abrigamento/internamento compulsório como será construído o vínculo com o usuário/a? Se a CF/88 explicita o direito à todo/a cidadão/ã uma imagem pública, como será a imagem de um/a usuário/a que sofre um internamento ou abrigamento compulsório, considerando o estigma que os/as usuário/as de substâncias psicoativas já sofrem frequentemente.

Nesse sentido, nenhum profissional assistente social deverá endossar o abrigamento e internamento compulsórios, deve-se buscar mobilizar coletivos de trabalho, a rede socioassistencial, o Ministério Público, os movimentos sociais e deve-se conhecer o perfil sócio-demográfico do público-alvo para viabilizar o desenvolvimento de uma vida livre e responsável dos usuários do Serviço Social.

A Assistente Social conselheira do CFESS Heleni Ávila inicia sua fala relatando que o cenário atual traz uma conjuntura de violação de direitos. Atualmente vem-se desenvolvendo por diversos municípios uma política higienista.

Existem três tipos de internações: a voluntária, quando o usuário de drogas pede para ser internado; a involuntária, quando uma outra pessoa solicita a internação, normalmente um familiar que deve exigir juntamente uma autorização médica; e a compulsória, quando a internação é uma solicitação judicial, necessitando de notificação ao Ministério Público.

Heleni também explicitou historicamente a sociedade das drogas. Não existe e nunca existiu uma sociedade sem drogas, sendo assim, não tem sentido essa guerra contra as drogas. Os rituais religiosos são exemplo disso fazendo uso de vinhos, chás, etc.

O modelo proibicionista das drogas parte do princípio do medo, trás os valores morais e os interesses econômicos-políticos como motivos para o não uso de drogas. A ONU traz dados como: o tabaco causou 5 milhões de mortes no mundo, o álcool 2,5 milhões e as drogas ilícitas 200 mil pessoas mortas no mundo.

As políticas de enfrentamento às drogas no Brasil acabam culpabilizando e criminalizando os/as usuários/as. Os governos desenvolvem ações policialescas, repressivas e violência em primazia às ações preventivas e ao tratamento.

O Serviço Social deve lutar pela descriminalização da posse e do uso pessoal de drogas, pela descriminalização do cultivo para uso pessoal, fazer a diferenciação entre o porte para o consumo e o porte para o tráfico e a luta para que a Anvisa libere a produção para uso terapêutico. Também deve lutar para que os recursos públicos sejam destinados aos serviços públicos e não para as comunidades terapêuticas que acabam por não prestar um serviço multiprofissional de qualidade.

Plenária: O enfrentamento ao preconceito no cotidiano profissional: um compromisso ético-político

A assistente social e professora da UFRJ, Marlise Vinagre Silva, iniciou o debate abordando sobre o cotidiano problematizado a partir da perspectiva histórico-critica, o cotidiano como senso comum e o cotidiano como espaço contraditório, como sendo um solo fértil para disseminação dos preconceitos.

Marilise partiu do princípio que homens e mulheres se constituem como produto de um determinado tempo, numa dada formação social concreta, de poder, de exploração e discriminação, cujo fulcro é a desigualdade. Segundo ela, esta produz consciências alienadas, pois ao se objetivarem, esses indivíduos sociais, fazem escolhas, criam e recriam valores, a partir de suas necessidades. Julgam coisas, seres e situações no seu agir cotidiano, de forma predominantemente acrítica a partir de referencias de utilidade imediata, ou seja, juízos de valor da moral dominante.

Para a professora, na sociedade capitalista a discrepância entre as necessidades do ser social e as oriundas do individuo, causa a produção da desumanização. “Isto faz com que as condições para o pleno desenvolvimento das capacidades humano-genericas sejam negadas. A partir disto o que se vê, é a construção do homem vulgar, egoísta, conforme concepção do próprio Marx onde os sentidos materiais, intelectuais do ser, acabam sendo banalizadas. O próprio domínio da produção de ideias, formas de sentir e de agir, passam a influir na construção de uma determinada moralidade, portanto, a moral dominante se metamorfoseia em ações concretas inspiradas nessas ideias, servindo para a reprodução da desigualdade estrutural” comentou Marilise.

Marilise comentou ainda que “a diversidade no gênero humano é constitutiva, parte integrante da singularidade, das particularidades e demandas especificas. Negar o valor da diferença e seu reconhecimento, assim como as demandas dela decorrente é negar a própria perspectiva dialética e histórico-crítica da tradição marxista. A teleologia remete à compreensão crítica dos fundamentos, da ideia de direitos humanos, das manifestações jurídicas, das lutas nos casos de violação de direitos civis, políticos, econômicos, culturais, assim como a compreensão clara dos limites e suas contraditórias possibilidades. Não entrando no engodo da legalidade jurídica, mas na construção da luta no campo da resistência”.
A expositora finalizou reafirmando a defesa dos direitos humanos com a ideia da construção da liberdade e da igualdade substantiva, inclusa a ideia de equidade. Defende a construção da real emancipação política como condição estratégica para isso, como horizonte da emancipação humana, assim, perseguindo a utopia da plena realização das necessidades humano-genéricas.

A segunda fala da mesa foi feita pela assistente social, pesquisadora do Centro de Estudos do Trabalho e Ontologia do Ser Social da Universidade Estadual do Ceará (CETROS-UECE) e conselheira do CFESS, Marylucia Mesquita.

A conselheira iniciou apontando os caminhos repassados a partir do que o conjunto vem fazendo, sobre o debate da livre orientação sexual e identidade de gênero. “Para impedir o desenvolvimento da lesbianidade, bissexualidade, o sistema opressor denominado de heterossexualidade compulsória passa a criar as condições objetivas para a homofobia, lesbofobia e transfobia” comentou Marylucia.
Segundo ela retirar o poder das mulheres, é controlada socialmente pela instituições, inclusive pela legislação, religião, mídia e esforços da censura, colocando-as como parte da propriedade dos homens. “A imposição pela coerção normativa das mulheres aos homens, afirma o domínio do espaço publico destinado aos homens. Isso assegura a posse destes sobre elas e pelas historias românticas, como tristao e isolda, romeu e julieta, musica, teatro, etc” explicou a Assistente Social.

Apontou também que a heterossexualidade é institucionalizada nas diversas instancias e espaços, (linguagem, sistema jurídico, etc) criando a opressão e prejuízos aos que se afastam do padrão de sexualidade imposto.

A professora concluiu que a pratica afetivo sexual dupla dimensão, (pública e privada / pessoal e coletiva) significa que as praticas afetivas sexuais possuem uma dimensão pessoal, realizadas por indivíduos singulares, (âmbito da ética privada) debate insuficiente, que contribui para as inúmeras formas de violência e opressão se reproduzam.

Dia 6

Mesa redonda: Resistência coletiva às violações de direitos expressão da violência

109_1373Embalado por depoimentos emocionados, Anderson Lopes, representante do Movimento Nacional de Pop Rua, reconheceu a relevância do trabalho dos/as assistentes sociais. Anderson se referiu a esta categoria, como profissionais que defendem a vida.

Assim como Anderson, Cacique Babau, denunciou as violentas e desumanas situações de violações às quais ambas as populações – (indígenas e população em situação de rua), vivenciam no Brasil. As duas lideranças denunciaram o Estado, como o maior violador.
Ao finalizar sua fala, Anderson agradeceu o apoio que o MNPR tem recebido dos Conselhos Federais de Serviço Social (CFESS) e de Psicologia (CFP). Aproveitou o momento para ressaltar que o apoio dos CRESS Paraná e Rio de Janeiro têm fortalecido muito a luta da pop rua nestes estados e a nível nacional.