Manicômios Nunca Mais

A nomeação de Valencius Wurch, ex-diretor do maior manicômio privado da América Latina, para a Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde, gerou manifestações diversas no Brasil. Em Curitiba o Coletivo Abraça Raps, composto por psicólogas/os, psiquiatras, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, usuárias/os do SUS, movimentos sociais, conselhos profissionais e sindicatos, também foi às ruas para protestar. O CRESS PR apoia este movimento, entendendo esta nomeação como uma forte ameaça às conquistas instituídas em 2001 pela Lei da Reforma Psiquiátrica.

O ato em Curitiba aconteceu nesta quinta-feira, dia 17, e teve como protagonistas diversos/as usuários/as da Saúde Mental, principalmente de CAPS AD (Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas), que manifestavam-se com cartazes e gritos de guerra contra a volta dos manicômios e em favor da efetivação das políticas de saúde mental previstas na Lei da Reforma Psiquiátrica.

O terapeuta ocupacional Cassiano Robert explica que a nomeação de Valencius Wurch é apenas mais um dos retrocessos: “Atualmente já vivemos retrocessos na política sobre drogas, pois há o evidente sucateamento dos CAPS AD e ao mesmo tempo há apoio e financiamento público a diversas comunidades terapêuticas, que são espaços que retiram a pessoa com abuso de drogas do seu território”. Ele explica que este método não é o correto pois é necessário manter a pessoa em seu território para se ter o melhor diagnóstico. Ele, assim como todo o Coletivo Abraça Raps, entende que a nomeação de Valencius representa uma possibilidade evidente de fortalecer as comunidades terapêuticas, que são equipamentos incompatíveis com a Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas.

Um dos aspectos preocupantes sobre as comunidades terapêuticas é a imposição da abstinência pelo usuário, fator que vai contra as diretrizes nacionais. A Política Nacional de Saúde Mental estabelece que o tratamento precisa ser mediado pela estratégia da redução de danos, não sendo a abstinência um dever do usuário que busca tratamento. Esta estratégia é confirmada como eficiente por uma das pessoas presentes na manifestação, que afirmou ter dependência de drogas e preferiu não se identificar. Ela atualmente é usuária de um CAPS AD e comenta que já esteve internada em clínica com regime bem rígido em diversos aspectos. “Eu não tinha a liberdade lá e vi muitas pessoas tentarem fugir. Enquanto estive lá fiquei afastada do uso de drogas mas ao sair foi rápida a recaída”. Hoje ela faz parte de um programa de redução de danos e afirma sentir-se muito mais disposta para a vida em sociedade, está mais feliz e animada com os resultados já alcançados e já está há tempos sem uso das drogas que lhe eram mais prejudiciais.

Presente na manifestação, a assistente social Edina Amato, do CAPS AD Boa Vista, afirmou: “hoje, estamos gritando pelo direito da pessoa escolher o tratamento, pelo direito à liberdade do cidadão. Liberdade esta que é um dos princípios do Serviço Social”. Ela afirma que o tratamento via manicômio deve ser terminantemente combatido e vê que o melhor caminho é o fortalecimento dos mecanismos previstos na Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas. “Em nossa unidade já vi pessoas chegando muito debilitadas e com vínculos rompidos. E a partir do projeto terapêutico de tratamento traçado em conjunto por profissionais e usuários estas pessoas foram resgatando vínculos familiares, voltaram a trabalhar e resgataram a dignidade”.

A manifestação desta quinta-feira movimentou a praça Rui Barbosa e seguiu até a Boca Maldita conclamando por direito à liberdade nos tratamentos na Saúde Mental. O CRESS-PR reforça o grito: “Por uma sociedade sem manicômios. Contra a manutenção de Valencius Wurch na coordenação geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde”.