Pelo 13º ano, Brasil é o país que mais mata pessoas trans em todo o mundo

#ParaTodasVerem: A imagem tem o fundo com as cores da bandeira trans, ao centro tem um coração também com as cores da bandeira e um casal trans no meio. A escrita na imagem informa a data, 29/01, Dia da Visibilidade Trans. Abaixo tem o logo do CRESS-PR.

A maioria da população trans no Brasil ainda vive em alta vulnerabilidade. A discriminação, a falta de acolhimento e de políticas públicas são fatores determinantes para que o país seja pelo 13º ano considerado o país que mais mata pessoas trans em todo o mundo, segundo a ONG Transgender Europe.  Em 2021, 140 pessoas trans foram assassinadas no país. Dessas, 135 travestis e mulheres trans e 5 homens trans e pessoas transmasculinas. Os dados são de um dossiê produzido por Bruna Benevides, pesquisadora trans que compila dados sobre a população transgênero há cinco anos.

Não existem dados oficiais sobre o tema. O levantamento realizado por Bruna é feito a partir de relatos de pessoas próximas das vítimas e informações que encontra em órgão públicos, organizações não governamentais e reportagens. A falta de informação e falar pouco sobre o assunto também são fatores que contribuem para que casos de violência contra essa população continuem acontecendo.

“A cultura patriarcal, machista e capitalista tem seu projeto de poder, porém frágil, pois não tolera, não suporta, não tem espaço para a diversidade, para a expansão e sempre objetifica nossas existências, nossos corpos, nossos saberes e fazeres, nossa produção científica também é colocada em cheque mesmo dentro da academia”, explica Djankaw Kilombola, artista interdisciplinar, ativista interseccional, estudante de Pedagogia do Campo Unicentro e integrante do Coletivo Bajubá LGBTTQIA de Guarapuava.

Djankaw se entendeu como trans desde criança, mas não sabia que tinha o direito de ser. “Eu já me identificava com uma identidade feminina, gostava de roupas, sapatos e objetos femininos, porém, com todos os sistemas de opressão que nos impõem desde cedo, acabamos no percebendo como aberrações e não enquanto uma possibilidade de ser e estar no mundo, uma outra possibilidade de mulheridade”, conta ela.

Transfobia

Desde 2019, a transfobia é crime no Brasil. Mas a cultura patriarcal e machista da sociedade não impede que casos de violência contra essa população continuem acontecendo, inclusive em rede nacional. Recentemente, assistimos casos de transfobia na maior emissora do país. Linn da Quebrada, mulher negra, travesti, participa da 23ª edição do principal reality brasileiro. Mesmo tendo o pronome ELA tatuado em sua testa, a cantora foi vítima de violência de gênero mais de uma vez dentro da casa mais vigiada do Brasil. A diferença do ato de transfobia sofrido por Linn e dos casos de violências que as pessoas trans comuns sofrem na sociedade é que esses ataques são às escuras.

Atos de violência de gênero acontecem com frequência. “As pessoas erram nossos pronomes porque são educadas a pensar errado, foram ensinadas a nos tratar de qualquer modo, culpa desses processos de violação de direitos e desumanização. Quando ocupamos espaços que não estavam destinados socialmente para nós, surgem esses conflitos. Eu não deixo passar! É preciso intervir para não se tornar hábito nos diferentes espaços”, enfatiza Djankaw.

 Saúde

Embora o Artigo 196 da Constituição Federal de 1988 diga que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, a realidade para pessoas transgêneras não é essa. A população trans e travesti ainda enfrenta muita dificuldade no atendimento disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Em 2021, a Política Nacional de Saúde LGBTQIAP+ completou 10 anos, mas ainda é um desafio colocá-la em prática. Relatos de discriminação, despreparo dos profissionais, acolhimento inapropriado, dificuldade no entendimento da transexualidade e a falta de políticas públicas e programas específicos voltados ao combate ao preconceito são algumas das dificuldades relatadas.

Serviço Social na luta pela dignidade da população trans

O Conselho Regional de Serviço Social do Paraná (CRESS-PR) reafirma o compromisso com a luta contínua por direitos e igualdade à população trans. “É muito necessário que as (os) Assistentes Sociais tenham consciência sobre a pluralidade sexual, para que possamos lutar pela garantia do respeito e se faça valer a liberdade individual de cada um. Qualquer maneira de amor, vale amar”, comenta Andréa Braga, presidenta do CRESS-PR.

É papel fundamental do Serviço Social lutar pela garantia dos direitos da população LGBTQIA+. Além de se posicionarem contra todas as formas de violência e discriminação, cabe às (aos) Assistentes Sociais o papel do acolhimento adequado a essa população nos espaços socio-ocupacionais. “Esse trabalho pode ser feito por meio de políticas públicas, da escuta ativa que ajude a compreender a trajetória de vida dessas pessoas e por meio de articulações com a rede de atendimento buscando o devido acesso aos direitos sociais”, explica Andréa.

Reafirmando o papel nessa luta contra o preconceito e na garantia de direitos da população trans, o CRESS-PR buscar promover formações, debates, reflexões, troca de informações e conhecimentos com a categoria profissional. Também são incentivados diálogos com diversos movimentos sociais com o objetivo de salvar vidas.

Dia da Visibilidade Trans

Neste sábado, 29/01, é celebrado o Dia da Visibilidade Trans. A data busca conscientizar a população sobre os números alarmantes relacionados às mortes dessas pessoas, além de promover reflexão sobre respeito à identidade de gênero e orientação sexual, garantir o uso do nome social, assegurar tratamento de saúde e a promoção de políticas públicas.

O dia da visibilidade trans representa a construção de um projeto social e político que respeite as demandas, agendas, pautas, lutas e conquistas da Comunidade T (travestis e transexuais) no Brasil. “Esse mês e dia representam muitas questões para nossa comunidade. A resistência e a luta por direitos são necessárias, pois somos sistematicamente distanciadas de casa, da escola, dos espaços de cuidado, afeto e lazer, sobrando somente e prostituição e a rua. Todas essas agências de poder, machismo, racismo, classismo, transfobia, se mostram nos mapas da violência”, enfatiza Djankaw.

Tais políticas públicas, que envolvem Segurança, Saúde, Educação, Habitação, Assistência Social, entre outras, devem garantir um atendimento digno à população LGBTQIA+. Com isso, é possível dar voz a essa luta, acolher demandas, planejar, promover e implementar respostas concretas para garantir a equidade, a dignidade e a proteção social. Além de tudo isso, essas políticas devem considerar as especificidades de orientação sexual e identidade de gênero, respeitando pronomes e o nome social das pessoas travestis e transexuais.

“Mesmo com todas essas agências de violação de direitos humanos, nós, transexuais, travestis, negras e indígenas reexistimos. Temos ocupado espaços e falado por nós mesmas. Nossas transcestrais não se calaram e abriram caminhos para que hoje pudéssemos estar aqui. Então continuaremos o legado travesti, quilombola, negra, ocupando nossos lugares de direito. Somos história, somos força, somos ancestralidade. Axé”, finaliza Djankaw.