Serviço Social, Trabalho, Instrumentalidade e Produção de Documentos Técnicos foram temas do Encontro On-line promovido pelo CRESS-PR

A atuação das (os) Assistentes Sociais é feita com base em dimensões metodológica, técnico operativa e ético política. São esses conhecimentos que permeiam o saber profissional na utilização dos instrumentos pela categoria profissional na realização dos atendimentos e preenchimento de documentos, como relatórios e prontuários. Com o intuito de atualizar as (os) profissionais sobre o tema, o CRESS-PR, por meio dos NUCRESS Paranavaí, Umuarama e Irati e com apoio da Seccional Londrina, realizou nesta semana dois encontros on-line para debater o assunto.

Os Encontros Regionais sobre Serviço Social, Trabalho, Instrumentalidade e Produção de Documentos Técnicos foram realizados na terça e quarta-feira, dias 11 e 12 de agosto, respectivamente. Analisar o processo de registro e a produção de documentos técnicos no âmbito da profissão e debater sobre a produção de material técnico-sigiloso no cotidiano profissional conforme as normativas da profissão foram questões tratadas durante os encontros, que reuniram profissionais e estudantes de Serviço Social das regiões já citadas.

Na terça-feira, 11 de agosto, a Assistente Social, Doutora e Professora Mabel Mascarenhas Torres trouxe aos participantes um panorama sobre o trabalho e as instrumentalidades utilizadas na prática profissional. Segundo Mabel, baseada na Teoria Social Crítica de Karl Marx, a lógica predatória do Capital afeta duplamente o dia a dia das (os) Assistentes Sociais, pois além de serem trabalhadoras (es) assalariadas (os), também trabalham atendendo a classe trabalhadora.

“A precarização do trabalho é um fenômeno mundial. Temos visto muitas pessoas se submetendo a subempregos para conseguir sobreviver e com salários que não suprem as necessidades. O Serviço Social é um importante agente nesse cenário, mas precisa de apoio de outras políticas, de saúde, de educação, de habitação para ser efetivo”.

Mabel explica que essa precarização do trabalho cria competição entre as (os) trabalhadoras (es), fazendo questionar “quem é necessário para execução do serviço?”. “Toda prestação de serviço gera essa competição, pois não há trabalho para todos. Automaticamente, quem acaba sendo descartado são as pessoas consideradas inúteis pelo capital, que são as pessoas muito jovens ou mais velhas, pessoas com deficiência, moradores de rua, e demais pessoas em vulnerabilidade social”.

Toda essa precariedade do trabalho é sentida pela categoria no exercício do Serviço Social. “Equipes cansadas, sobrecarregadas pelo excesso de trabalho, principalmente em meio à pandemia, com sentimento de impotência, tendo que bater metas mesmo em tempos pandêmicos. Com isso, o sistema protetivo fica à mercê. Tudo isso é consequência da falta de investimento, do derretimento de direitos e falta de políticas públicas dos Governos”, contextualiza.

Para contornar essas situações, Mabel explica que as instrumentalidades são necessárias. “Instrumentalidade é mediação, conhecimentos, ações, estratégias, prática de conhecimento teórico. Antes de tudo precisamos planejar o nosso trabalho, saber reconhecer demandas, os limites e os desafios impostos”.

A profissão de Assistente Social é regulamentada pela Lei 8.662/1993, que concede autonomia à categoria no exercício. Além disso, o código de ética e o conhecimento teórico-prático moldam a técnica na hora de identificar quais instrumentos usar em ações diretas com os usuários das Políticas Públicas do Serviço Social, como entrevistas, controle social, documentos técnicos, entre outros.

“É preciso sistematizar o nosso trabalho, analisando dados e transformando-os em informações necessárias para suprir demandas. Essa sistematização ajuda a construir um banco de dados que gera conhecimento e faz as (os) profissionais pensarem, analisarem situações e sugerirem ações efetivas”, finaliza Mabel.

No segundo dia do encontro, realizado na quarta-feira, 12 de agosto, os convidados da noite conversaram com os participantes sobre a produção de documentos técnicos. As falas complementaram as considerações trazidas por Mabel no encontro anterior e trouxeram reflexões sobre o tema abordado.

A noite começou com a fala do Assistente Social, Doutor em Serviço Social e Professor do Departamento de Fundamentos do Serviço Social da Escola de Serviço Social da UFRJ, Charles Toniolo. “Há várias formas de registrar a atuação por escrito. O que relatamos é um link com a realidade e define os rumos das ações. Por isso é preciso ter cuidado com o que e como escrevemos”, explica o Assistente Social.

Charles explica que o Serviço Social surgiu de uma ordem burguesa para tentar amenizar as desigualdades sociais e corresponde às necessidades impostas pela sociedade, mesmo que questione os métodos, pois é uma profissão como outra qualquer. “Isso requer um mercado de trabalho. Se as necessidades deixarem de existir, nossa profissão acaba”.

Há três dimensões para a prática profissional do Serviço Social, sendo elas a ético-política, a teórico-metodológica e a técnico-operativa. Tendo essa premissa como base do exercício profissional, Toniolo explicou cada uma das dimensões.

“Dentro da dimensão ético-política, somos sociais e agimos guiados por valores: o que é certo, o que é errado, o que é bom, o que é ruim, o que pode e o que não pode. Nossas ações tomadas a partir desses valores afetam a vida das outras pessoas, com direção política e, inclusive, em relações de poder”.

A segunda dimensão, teórico-metodológica, permite que ações sejam tomadas a partir de algum nível de conhecimento. “Não há prática sem fundamentação teórica, ainda que a prática seja feita por outra pessoa que não seja a mesma que produziu o conhecimento teórico”, explica.

Para Charles, nenhum instrumento tem vida sem não houver um operador e sem dimensão teórica, por isso é necessário se atentar para o que os fundamentos teóricos falam, para saber como fazer um documento técnico, uma articulação com ética profissional e criar processos para a emancipação humana e relações sociais sem abusos e mais igualitárias.

A partir desse entendimento a categoria está inserida na terceira dimensão da prática profissional, a técnico-operativa. “Os documentos que produzimos são instrumentos indiretos, que visam a comunicação e aferem veracidade para atingir um determinado objetivo. A pessoa que ler esse documento vai produzir intervenções a partir das nossas intervenções. Ou seja, a forma como registramos algo interfere em como a outra pessoa vai entender, muitas vezes baseada em senso comum”, garante Toniolo.

“Não existe neutralidade, qualquer texto terá a visão e os valores éticos-políticos de quem escreveu, mas é necessário que o profissional deixe clara sua visão baseada nas dimensões que permeiam a prática do serviço social para que não haja interpretações erradas pela parte de outras pessoas e que ações efetivas sejam tomadas para solucionar problemas”, completa.

Para finalizar as reflexões, a Assistente Social com Doutorado em Serviço Social e Política Social pela Universidade Estadual de Londrina, Mileni Alves Secon, explicou a atuação da Comissão de Orientação e Fiscalização (COFI) do CRESS-PR.

Segundo Mileni, a COFI tem o compromisso de exercer ações por meio de políticas públicas e com respeito e responsabilidade nos variados espaços de atuação de Assistentes Sociais. “A COFI recebe as demandas da categoria, dos usuários e de instituições ligadas ao Serviço Social. Essas demandas são analisadas e tomadas as medidas cabíveis, podendo ser elas mediadas de orientação ou punitivas”.

“A COFI tem o compromisso de valorizar, garantir e ampliar os lugares de trabalho da categoria. Além de orientar a categoria e a sociedade sobre a não violação do trabalho das (os) Assistentes Sociais, que têm autonomia e conhecimento teórico-prático para desenvolver ações em favor do direito democrático e contra violências sociais, de gênero, de raça, entre outras”, explica a Assistente Social.

“Muitas vezes as (os) Assistentes Sociais acabam por exercer práticas que não cabe em determinado ambiente de trabalho por obedecerem às ordens de superiores. Como profissionais, sabemos quais os métodos e requisições utilizar em determinadas situações, garantindo a politização e a tomada de ações necessárias e assertivas”, explica Mileni.

Mileni explica também que o CRESS-PR, por meio da COFI, desenvolve ações punitivas quando o Código de Ética e a Legislação da profissão são desrespeitadas, seja pela (o) profissional, empregadores ou sociedade, garantindo a responsabilidade, a autonomia e a liberdade do exercício profissional.