Nota Pública do CRESS-PR em defesa do Sistema Único de Assistência Social e do Controle Social no Paraná

Durante a pandemia do novo Coronavírus o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) tem-se mostrado ainda mais essencial às populações vulneráveis e que vivem em condição mais desigual, tendo em vista a grande demanda de violações de direitos e desproteções sociais. É sabido que mesmo antes do período de contágio da COVID-19, a Política de Assistência Social já estava passando por um processo de precarização e desmonte progressivo, especialmente quanto ao repasse de recursos financeiros dos governos Federal e Estadual aos municípios, tendo em vista o desfinanciamento provocado pela vigência da Emenda Constitucional nº 95/16, bem como em relação ao enfraquecimento das instâncias de pactuação e de deliberação que compõem o controle social do SUAS, dificultando a manutenção de serviços, programas, projetos e benefícios. Tal cenário possui implicações e rebatimentos nos demais entes federados, considerando, sobretudo, a ausência da coordenação nacional e do pacto federativo no SUAS.

Neste sentido, cabe mencionar que no Paraná, desde o último dia 19 de junho, as reuniões do Conselho Estadual de Assistência Social – CEAS estão suspensas devido ao vencimento do mandato dos/as conselheiros/as da sociedade civil.

Considerando as restrições frente ao cenário pandêmico, as eleições para composição da sociedade civil para o colegiado do CEAS foram suspensas e com isso, em 30 de abril do corrente ano, após plenária, foi editada a Deliberação nº 32/2020 que trata da prorrogação do mandato da sociedade civil pelo período de 12 meses, com alternância da presidência a cada 06 (seis) meses, a partir do dia 19 de junho de 2020. Como o prazo e período de realização da eleição estão previstos em lei é preciso aprovar sua alteração junto à Assembleia Legislativa. Diante disto, o CEAS solicitou à Secretaria de Justiça, Família e Trabalho, órgão responsável por garantir apoio técnico e financeiro ao colegiado, o encaminhamento do projeto de lei. Projeto esse que, ainda, aguarda aprovação da Assembleia Legislativa, que apenas recebeu o encaminhamento em Plenária no dia 02 de julho de 2020, isto devido à morosidade de envio por parte do Executivo do Estado.

O Conselho Estadual de Assistência Social, criado pela Lei nº. 11.362, de 12 de abril de 1996, é um órgão colegiado de caráter deliberativo e permanente, conforme previsão na Constituição Federal de 1988 da democracia participativa, que institui uma nova relação entre o Estado e a Sociedade, ao inaugurar um meio de participação democrática e cidadã que tem como função essencial acompanhar, aprovar, estabelecer diretrizes e fiscalizar a Política de Assistência Social no Estado do Paraná. É composto por 30 (trinta) membros, dividido paritariamente entre sociedade civil e governo, conforme artigo 9º da referida lei de criação.

Para constituição dos representantes da sociedade civil, a cada 02 (dois) anos é realizada uma eleição que visa absorver 3 (três) segmentos da sociedade: trabalhadores/as, entidades e usuários/as, que podem ser oriundos das diversas macrorregionais do Estado. Entretanto, foi necessária a suspensão do processo eleitoral referente ao biênio 2019-2021, considerando o atual cenário pandêmico e extraordinário em que nos encontramos, o que pode inviabilizar a realização das eleições de forma plena, uma vez que os estados e municípios teriam dificuldades para atender à legislação integralmente, em função da impossibilidade de realizar assembleias, reuniões e eventos para escolha de novos integrantes da sociedade civil para compor o colegiado.

Assim sendo, o colegiado do CEAS visando garantir o funcionamento do controle social, encaminhou dia 30/04/20, ou seja, com mais de 60 dias de antecedência, uma deliberação solicitando a prorrogação do mandato, porém o executivo Estadual apenas deu sequência ao encaminhado após vencimento do mandato, deixando assim o Estado sem representantes da Sociedade Civil para o controle social na Assistência Social no Estado. Além disso, até o presente momento, os/as conselheiros/as estaduais não receberam resposta positiva sobre a regulamentação legal e necessária para a continuidade do controle social exercido pelo Conselho.

Ressalta-se que segundo a Resolução CNAS nº 237/2006, que define as diretrizes para a estruturação, reformulação e funcionamento dos Conselhos de Assistência Social:

Art. 9º – O controle social é o exercício democrático de acompanhamento da gestão e avaliação da Política de Assistência Social, do Plano Plurianual de Assistência Social e dos recursos financeiros destinados a sua implementação, sendo uma das formas de exercício desse controle zelar pela ampliação e qualidade da rede de serviços socioassistenciais para todos os destinatários da Política.

Importante salientar que a participação social está assegurada pela Constituição Federal, em artigo 204, inciso II, que determina que as ações governamentais serão realizadas tendo como diretriz: II – participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação da Política e no controle das ações em todos os níveis.

É por meio dos Conselhos de Assistência Social que a população participa da gestão da política de assistência social nos três níveis de governo, sendo fundamental seu adequado funcionamento, mesmo neste momento de pandemia, garantindo que a política de assistência social conte com controle social, respeitadas as orientações dos órgãos de saúde.

A situação supramencionada demonstra  descaso do Estado em relação à execução da Política de Assistência Social no Paraná, especificamente no que se refere ao pleno funcionamento do controle social, tendo em vista as atribuições dos Conselhos de Assistência Social definidas na Norma Operacional Básica do SUAS, em seu art. 119, §3º:  “No exercício de suas atribuições, os conselhos normatizam, disciplinam, acompanham, avaliam e fiscalizam a gestão e a execução dos serviços, programas, projetos e benefícios de assistência social prestados pela rede socioassistencial.” 

Ademais, destaca-se que antes mesmo da suspensão das reuniões do CEAS/PR, um desmonte progressivo vem acontecendo, podendo ser observado na omissão ao subsídio logístico para acesso à estrutura tecnológica necessária à participação dos/as conselheiros/as da sociedade civil nas reuniões remotas, tendo em vista que alguns membros do conselho não tem acesso à internet em seus domicílios e/ou possuem dificuldades com o manuseio das mídias necessárias para a participação nas web conferências; no descumprimento do calendário de reuniões deliberado em plenária; na redução do tempo das reuniões, o que impede a análise adequada das pautas; no desmonte gradual da estrutura da Secretaria Executiva do Conselho; na obstrução da livre deliberação sobre temas que contestam pontos da agenda institucional do governo do Paraná; entre outras questões que afetam diretamente a participação dos membros do colegiado que vem encontrando dificuldades na execução de suas funções precípuas no controle social.

Destaca-se que o momento demanda maior participação do controle social em relação ao acompanhamento, avaliação e à fiscalização das ações adotadas pelo Estado, considerando que o período permite, excepcionalmente, atos como a dispensa de licitação para execução dos recursos vinculados à Política de Assistência Social, exigindo maior atenção do controle social combatendo assim a fragilização da gestão e defesa da preservação dos serviços continuados.

A política de Assistência Social tem sido fragilizada e o SUAS inviabilizado no estado do Paraná, tendo em vista a ausência de comando único e de condições políticas e institucionais para a garantia de orçamento e de provisão de serviços e benefícios, considerando o ordenamento normativo e jurídico vigente.

É urgente o estabelecimento de condições para o cumprimento de corresponsabilidades do estado do Paraná para a garantia do direito à assistência social a quem dela precisar, o que implica financiamento público, comando único, capacidade de gestão, equipes qualificadas, estruturas em pleno funcionamento para o desenvolvimento das funções da política de Assistência Social, bem como das instâncias de pactuação e deliberação. Entendemos como necessária a adoção de medidas urgentes pelos órgãos de fiscalização e de defesa de direitos, para a retomada plena e imediata das atividades do Conselho Estadual de Assistência Social (CEAS/PR), órgão deliberativo, normativo e fiscalizador, visando garantir o adequado funcionamento do colegiado e suas funções essenciais, tanto no período de combate ao COVID-19, quanto no pós-pandemia, assim como providências adequadas para o a cumprimento das responsabilidades do governo do Estado no sistema descentralizado e participativo instituído de modo democrático no Brasil.