O terceiro dia do 7° Congresso Paranaense de Assistentes Sociais (CPAS), no sábado (28), começou com três mesas simultâneas. Duas delas ocorreram no Sindicato dos Servidores Municipais de Ponta Grossa: “Sistema de Justiça, Políticas Públicas e Exercício Profissional” e “Desigualdade, Cidades e Territórios: desafios da participação e da gestão democrática”. No auditório da UEPG, foi realizada a mesa “Produção de Conhecimento, Formação Profissional e Supervisão de Estágio”. As três mesas reuniram grande número de participantes.
Mesa “Sistema de Justiça, Políticas Públicas e Exercício Profissional”
A mesa foi composta pelas palestrantes Tamíres Caroline de Oliveira (DPPR e CRESS-PR), Daniela Moller (CFESS) e Denise Colin (MPPR). Ao falar sobre o tema da palestra, Tamires lembrou a colonização pela qual passou o Brasil foi violenta, exterminando e escravizando muitas identidades. Os reflexos dessa punição de determinadas populações dentro do país, conforme expôs a palestrante, teve reflexos históricos que se aprofundaram com o golpe do ano de 2016.
As violências e as violações são graves em qualquer situações, apontou Tamires. “No Brasil isso tem seletividade racial e acomete a população negra, pobres e mulheres. No sociojurídico estamos vendo essa intensificação das judicialização das demandas dos conflitos e a criminalização da população pobre”. Ela lembrou que as/os Assistentes Sociais tem sido convocados a responder requisições dentro desse cenário. “A gente precisa considerar as violações de direitos, a luta e a questão teórica dos direitos. Nós atuamos em equipes interdisciplinares nos espaços visando respostas que alterem esses cenários e deem respostas a essas populações”, explica.
Na opinião da conselheira federal do CFESS, Daniela Moller, vivemos um processo de relativização de conquistas históricas e civilizatórias, negação da tortura e do arbítrio. Além disso, a palestrante lembrou que não é possível pensar o debate sobre o tema da Mesa sem pensar em princípios éticos, defesa da democracia, garantia de Justiça Social e de Direitos Humanos. “Estamos falando dos sujeitos sociais e políticos e não apenas dos processos sociais”, afirmou.
Daniela explicou que Justiça não tem o mesmo significado que tribunal de Justiça. “É algo pelo qual lutamos, não é um órgão de poder do sistema. De fato, não é incomum que as pessoas digam sobre o judiciário, em vários casos judicializados, frases do tipo “não sei quem está certo’, mas o juiz dirá o que ocorreu”. Seriam os órgãos do sistema que diriam qual é a verdade dos fatos. Com isso, muitas vezes, a vítima, além de ser julgada pelos meios oficiais, é julgada de forma moral pelas pessoas”, disse.
Denise Colin reforçou a necessidade que as/os Assistentes Sociais têm, em sua função de fortalecer projetos democráticos. Ela lembrou que cada vez mais diversos grupos sociais, como mulheres, negros, LGBTI+ e migrantes, demandam os sistemas de proteção social e garantia de direitos na perspectiva de Direitos Humanos. “Precisamos nos preparar para incluir essas pessoas nesses âmbitos”, afirmou.
Ao refletir sobre a concepção de Justiça na atualidade, Denise disse que o entendimento que temos nos direciona para aquilo que chamaríamos de manutenção do sistema capitalista e expropriação da classe trabalhadora. Ainda assim, essa concepção de Justiça tem a premissa de garantia de direitos. “O trabalho da/do Assistente Social é conseguir trazer sua capacidade de fazer crítica às relações que se colocam em espaços como o Poder Judiciário, a Defensoria Pública e o Ministério Público. Precisamos questionar quais as questões sociais em cada momento, conseguir identificar finalidades constitucionais, mediação, quais as demandas da classe trabalhadora, qual a realidade de cada conjuntura, mas sempre pautado por nosso projeto ético político”, afirma.
Desigualdade, Cidades e Territórios: desafios da participação e da gestão democrática
Participaram das discussões da mesa sobre “Desigualdade, Cidades e Territórios: desafios da participação e da gestão democrática”, como palestrantes, Tatiana Dahmer (UFF), Sandra Schefer (UEPG) e Paulo Bearzoti Filho (MPM). Tatiana abriu o debate explicando que a questão das desigualdades têm materialidade na “carne das pessoas” e sempre foram motivo para a morte de certos grupos de pessoas. “A gente não pode olhar para os territórios, luta por sua ocupação e resinificação sem ouvir e pensar um pouco porque chegamos a esse ponto. Olhar sobre a história não pode ser positivando a história, mas pensando nas suas tragédias, que não são episódicas, mas cotidianas e profissionais”, disse.
A palestrante ainda firmou que vivemos no Brasil uma crise estrutural do território, motivado por interesses do capital na obtenção de lucro e dinheiro. “Diversas formas de exploração do território tem sido movimentadas pelo capital. Lutamos muito anos na tentativa da expansão de uma forma que favorecesse a distribuição de riquezas. Mas essa tentativa foi gerando elementos contra nós mesmos. Na medida que o valor não consegue expandir, se acirram as formas de criminalização de todos aqueles que não são aquele ser humano bem visto pelo sistema”.
Na sequência, Paulo Bearzoti Filho, representante do Movimento Popular por Moradia (MPM), explicou que dentro dos movimentos sociais a moradia se colocou como uma pauta específica e concreta de luta, mas é necessário articulações mais amplas dos movimentos para que a luta não caia no conservadorismo. “Se eu não tenho dimensão mais ampla, ou caio no caráter conservador ou não preparo as pessoas para a resistência quando vem o avano conservador”, disse.
Paulo deu como exemplo os movimentos que aconteceram nos governos petistas, em que lutou-se por causas específicas, como o acesso a alimentação, moradia e educação, mas as políticas nçao estavam associadas a uma compreensão mais ampla da situação do país. “O que vejo como movimento popular é a ideia de uma organização a partir do local de moradia, trabalhando com o princípio do território. Claro que existe uma questão individual, mas há uma dimensão histórica. O nosso grande desafio é unir a causa específica a causa maior”, disse.
Ao falar sobre o direito à cidade enquanto um direito coletivo, Sandra Scheffer (UEPG) apontou para a importância da/do profissional de serviço social de se inserir mais na lógica de planejamento da gestão urbana, já que são profissionais que possuem um olhar ampliado sobre a realidade e podem dar um direcionamento a essa questão conforme as necessidades que se apresentam e a leitura que essa/esse profissional faz da realidade. “Devem trabalhar com a base para que ela se insira no planejamento e traga a sua realidade, porque se não nos inserirmos, enquanto profissionais do Serviço Social nesta questão, outros profissionais vão se inserir, como aqueles das engenharias e da Arquitetura”.
Outro ponto abordado pela palestrante foi a diferenciação entre habitação e moradia. Ela explicou que a Constituição de 1988 prevê que cada pessoa no Brasil possui o direito à moradia. Porém, nossa política está voltada para a área habitacional. A princípio, explica Sandra, parecem sinônimos, mas não são. “A moradia é mais ampla. Ela engloba a habitação, que, por sua vez, se resume a parte física do imóvel. A moradia é qualificada pela ONU, como necessidade de cidadãos terem moradia digna e adequada. Para isso, é necessário contemplar esse sujeito que vai viver nesse imóvel, para quem é feita a casa. Esse é um sujeito que tem vontades, que quer se inserir na comunidade. Deve ser levada em conta uma amplitude de direitos em relação à moradia”, afirmou.
Produção de Conhecimento, Formação Profissional e Supervisão de Estágio
Esther Lemos (ABEPSS) e Jussara Ayres Bourguignon (UEPG) participaram da discussão na mesa sobre “Produção de Conhecimento, Formação Profissional e Supervisão de Estágio”, realizada no auditório da UEPG. Jussara opinou sobre a importância dos projetos de extensão na formação acadêmica. Ela explicou que nesses projetos, a/o usuária/o do Serviço Social é uma força presente, que tem um peso relevante até mesmo no processo de avaliação do aluno. “É ele quem traz as demandas para a profissão, aquilo que vai ser problematizado e depois transformado em objeto de reflexão. A extensão é planejada em função de uma demanda concreta da realidade, de inserção do conhecimento produzido na universidade e que possa mexer nas estruturas e criar novas formas de sociabilidade”.
Jussara ainda afirmou que mesas de discussão com essa temática, proporcionada pelo 7° Congresso Paranaense de Assistentes Sociais (7° CPAS), mostram a necessidade de troca de experiências e conhecimentos, além de estimular a reflexão e o compromisso na formação de qualidade, comprometida com o projeto político profissional do Serviço Social. “Precisamos criar um espaço ao longo do processo de formação profissional em que a dimensão investigativa seja potencializada e que seja trabalhada na interação e articulação em todos os sujeitos envolvidos no processo de formação profissional, que são os alunos, professores e profissionais”, disse.
Levando em consideração a mesma linha de importância do ensino e pesquisa no Serviço Social, Esther Lemos pautou a questão de como as/os Assistentes Sociais precisam colocar a supervisão de estágio, que é atribuição privativa das/os profissionais, como objetivo de estudo e produção de conhecimento sobre a realidade. “O estagio é obrigatório e para sermos Assistentes Sociais precisamos passar pela experiência do estágio e precisamos qualificar esse momento. Isso passa por colocá-lo como objeto de estudo”.
Ela ainda mencionou a importância do Movimento Estudantil nesse processo como sujeitos e protagonistas do estágio e formação profissional. “É o momento que essa/esse profissional pode desenvolver a partir do estagio tanto aquilo que defendemos como sendo a naturza da profissional como também a natureza interventiva. Nesta intervenção, vemos a necessidade de investigação da realidade”, pontuou.