Nota de repúdio à Gazeta do Povo pelo lançamento do ‘Monitor de Doutrinação’

Monitor-doutrinação

O jornal Gazeta do Povo lançou no dia 6 de dezembro uma plataforma chamada “Monitor da Doutrinação”, destinada à recepção de denúncias de doutrinação ideológica nas escolas e universidades do Brasil, sob a justificativa de crescentes casos de condutas consideradas inapropriadas, qualificadas como de doutrinação: “quando um professor usa seu tempo em sala de aula para extrapolar os conteúdos pré-definidos com claro posicionamento ideológico”. Além da recepção de denúncias, o jornal se colocou como promotor de averiguação dos casos.

Numa evidente concordância com posições conservadoras, que ferem os direitos humanos, notadamente a defesa da “Escola sem Partido” e a “Ideologia de Gênero”, a Gazeta do Povo criou o portal afirmando que faria a verificação e escuta das respostas dos envolvidos. As análises jurídicas qualificam a plataforma de iniciativa da Gazeta do Povo como inconstitucional, considerando o Código Penal, por configurar ameaça, constrangimento ilegal e associação criminosa.

As primeiras denúncias veiculadas caracterizam uma espécie de tribunal de perseguição de alguns professores/as e de propagação da violência simbólica típica de Estados totalitários e cerceadores de comportamentos considerados fora do padrão dominante, que viola as liberdades, a dignidade, os direitos humanos. Lembra um tribunal de inquisição da época medieval. É possível identificar, nos casos divulgados, a propagação da chamada ‘ideologia de gênero’, com total desqualificação das experiências e vivências de educação em direitos humanos sobre temas como gênero e sexualidade. Outras denúncias revelam o desrespeito ao pluralismo e à convivência democrática no ambiente escolar, assim como a formação integral para a cidadania.

As denúncias desqualificam processos pedagógicos que questionam os padrões cis-heteronormativos que oprimem milhares de crianças e adolescentes, desencadeando inclusive situações de auto-violência, além de serem estratégias pedagógicas que promovem a cultura de direitos, as alteridades, o respeito às identidades, às singularidades. Há ainda casos apresentados no jornal que reforçam o patrulhamento ideológico a professores/as que se posicionam sobre o cenário político, configurando a defesa de um Estado sectário, com pensamento único.

O Conselho Regional de Serviço Social do Paraná – CRESSPR – se posiciona em defesa da liberdade de expressão, do pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes, da democracia, do Estado democrático de direito, de uma educação transformadora, em consonância com os eixos, princípios e as diretrizes do III Programa Nacional de Direitos Humanos, que expressa a concepção contemporânea de direitos humanos, tendo resultado na ampla participação popular.

Destacamos as diretrizes fundantes da política nacional de educação em Direitos Humanos para fortalecer uma cultura de direitos. As diretrizes, neste eixo, apontam para o fortalecimento dos princípios da democracia e dos Direitos Humanos nos sistemas de educação básica, nas instituições de ensino superior e nas instituições formadoras; o reconhecimento da educação não formal como espaço de defesa e promoção dos Direitos Humanos; a promoção da Educação em Direitos Humanos no serviço público; a garantia do direito à comunicação democrática e ao acesso à informação para a consolidação de uma cultura em Direitos Humanos.

Na data de ontem, 10 de dezembro, às 21h34, o jornal emitiu nota retirando do ar esta plataforma, após reações diversas de repúdio. Mesmo com a retirada do ar, o CRESS-PR manifesta também o repúdio à ação realizada de criação e divulgação do portal. O Conselho recomenda providências pelos órgãos de controle, movimentos e organizações em direitos humanos, visando a responsabilização da Gazeta do Povo, tendo em vista a violação de direitos humanos de professores e estudantes, além de fomentar e reforçar posturas antidemocráticas e atos de violência e de ódio, o que têm afetado especialmente populações mais discriminadas socialmente e que sofrem mais os efeitos da desigualdade de classe, gênero e racial.

Nos colocamos solidariamente na defesa dos/as professoras que buscam construir ambientes educativos democráticos, que respeitem as diversidades e o pluralismo. As/os Assistentes Sociais têm como um de seus princípios fundamentais a defesa intransigente dos direitos humanos e a recusa do arbítrio e do autoritarismo. Nosso exercício profissional é pautado nesta defesa, de modo a materializar o projeto ético-político da profissão na direção de uma sociedade livre de toda forma de opressão e desigualdade, com plena expansão dos indivíduos sociais, uma sociedade emancipada.

 

Por: Direção do CRESSPR. Gestão Tempo de Resistir, nenhum direito a menos