Reflexões sobre População em Situação de Rua e Economia Solidária

A assistente social Marilena Silva, Especialista em Gestão de Políticas Sociais, que já foi conselheira do CRESS-PR, participou do seminário “População em Situação de Rua e Economia Solidária: construindo uma nova sociedade”, realizado nos dias 3 e 4 de maio.

Marilena lança algumas reflexões sobre os direitos da população em situação de rua e a importância da economia solidária como fonte de geração de renda para estas pessoas, além de falar sobre a atuação da/o Assistente Social neste cenário. Confira: 

Reflexões sobre População em Situação de Rua e Economia Solidária

Fruto do esforço coletivo de milhares de atores da sociedade civil organizada e gestores do governo federal, com envolvimento de estados e municípios, a política pública nacional de economia solidária vem se materializando em ações como a vivenciada no Seminário População em Situação de Rua e Economia Solidária: construindo uma nova sociedade.

O evento foi realizado entre os dias 3 e 4 de maio, pelos membros do Centro de Formação Urbano e Rural Irmã Araújo – CEFURIA, em conjunto com a Incubadora de Economia Solidária TECSOL – Núcleo Interdisciplinar de Tecnologias Sociais e Economia Solidária da Universidade Tecnológica Federal do Paraná e o Movimento Nacional da População em Situação de Rua – MNPR.

No Brasil a Economia Solidária ganha visibilidade a partir da década de 1990, concomitante ao processo de redemocratização que viveu o país e o impulsionamento de grandes experiências associativas que passam a ser organizadas pelos trabalhadores/as no meio urbano e rural. A característica desses empreendimentos alternativos ao mundo capitalista e suas disputas é o reconhecimento de práticas culturais que valorizam o ser humano e o meio ambiente, contrapondo-se ao mundo do trabalho explorador, eliminando as relações subordinadas e as hierarquias no processo produtivo e na gestão do trabalho.

O conceito apresentado na 1ª Conferência Nacional de Economia Solidária, realizada em Brasília entre 26 a 29 de junho de 2006, a define como o conjunto de atividades econômicas de produção, distribuição, consumo, poupança e crédito, organizadas e realizadas solidariamente por trabalhadores e trabalhadoras sob a forma coletiva e autogestionárias. Já para os militantes que compartilham dessa forma de organização social a Ecosol, como chamamos, gera o bem viver através da promoção de práticas solidárias com diversas iniciativas de produção, consumo, comercialização, que visam emancipar o ser humano através de vivências de solidariedade e cooperação. O Projeto COOPERA RUA se insere no conjunto de ações são desenvolvidas pela Secretaria Nacional de Economia Solidária – SENAES, que desde o ano de 2003 acumula experiências e atos concretos no fortalecimento institucional da Economia Solidária e no apoio da organização dos empreendimentos, com atividades de formação e fomento a redes de comercialização e crédito.

Em Curitiba o convênio entre a SENAES e o CEFURIA oportuniza o projeto que se desenvolve desde outubro de 2014, capacitando agentes de desenvolvimento locais para sensibilizar pessoas em situação de rua, utilizando a pedagogia da educação popular de Paulo Freire através de rodas de conversa e outras dinâmicas para discutir temáticas referentes a direitos humanos, políticas públicas, cultura e arte na rua e economia solidária. O objetivo do projeto é fomentar a geração de renda para a população em situação de rua por meio da inserção nas iniciativas da economia solidária.

No Seminário participaram cerca de 130 pessoas entre população em situação de rua de Curitiba, apoiadores e gestores do projeto, representações de Belo Horizonte e Porto Alegre, além de alunos e professores das universidades participantes das incubadoras presentes.

A sensibilização para a solidariedade humana na partilha dos sonhos, a construção de sonhos coletivos e a busca de realização foram os tópicos do primeiro dia do encontro. Diálogos Solidários foi o tema da primeira roda de conversa que contou com a participação da Coordenadora do CEFURIA, Ana Inês Souza, que expôs a história do Centro e afirmou: “A horizontalidade e a democracia participativa são uma alternativa à exploração do trabalho, ao individualismo, à destruição do meio ambiente e a Economia Solidária é uma alternativa ao modo produção e consumo capitalista”.

Também dessa roda participou o Coordenador do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, Leonildo Monteiro, iniciando com o ato simbólico de um minuto de silêncio dos participantes em memória às pessoas em situação de rua que morreram em Curitiba nos últimos meses. Leonildo reafirmou a Economia Solidária como uma possibilidade de resgate da autoestima das pessoas frente à ditadura do capital e como alternativa viável a exclusão social que resulta em mortes.

A professora Marilene Zazula apresentou na roda de conversa a TECSOL como também parceira no incentivo a criação dos empreendimentos solidários.  As trocas de experiências foram constantes em todas as dinâmicas, na parte da tarde, outras importantes iniciativas foram compartilhadas pelos grupos de economia solidária participantes das padarias comunitárias de Curitiba, da rede Pinhão de trocas solidárias e da feira permanente de Economia Solidária.

No segundo dia do evento a amanhã foi recheada com a afirmação dos presentes no compromisso em levar adiante o sonho de solidariedade que se consolida nas experiências vivenciadas. Na roda de conversa foi apresentada a rica vivência partilhada na Escola Porto Alegre, com sua experiência na educação de jovens e adultos da rua na sua busca de emancipação. Outro importante relato feito na roda de conversa foi sobre o Projeto Empreendendo Vidas, experiência relatada por membros da equipe técnica e por pessoas em situação de rua de Belo Horizonte, que constituíram seus empreendimentos de economia solidaria na área de gastronomia e jardinagem, reafirmando o resgate da dignidade daqueles que sofrem na vulnerabilidade social.

O período da tarde foi dedicado ao encontro da rede Estadual de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares, as quais têm qualificado o assessoramento a grupos que buscam superar suas dificuldades materiais e consolidar formas de resistência a exclusão provocada pelo modelo capitalista de produção.

Por fim, fica o aprendizado de que ainda está por acontecer a adequada articulação para que se efetivem mais  ofertas como as apresentadas, e ficou claro a vontade dos presentes em fazer acontecer a mudança necessária para dar dignidade as suas vidas, incluindo as iniciativas de economia solidária em equipamentos sociais públicos como uma das alternativas para o fortalecimento da relação entre economia solidária e população em situação de rua na busca de sua emancipação.

A gente quer ser visto como cidadão, sujeito de direitos. E a Economia Solidária abre nossos sonhos, ao gerar renda e resgatar a autoestima”, sintetiza Leonildo Monteiro, coordenador do Movimento Nacional da População em Situação de Rua e membro do projeto Coopera Rua.

Nós, assistentes sociais, cujo objeto de trabalho está imerso nas manifestações da questão social, contribuímos nessa experiência nos diversos espaços onde se faz a reflexão e a problematização da realidade do mundo do trabalho e seu contexto excludente, atuando com a instrumentalidade própria do serviço social na perspectiva do fortalecimento dos grupos e na consequente busca por autonomia, seja na construção da crítica social e na compreensão da realidade que nos oprime, seja na realização das articulações possíveis com as políticas públicas necessárias para a superação de desigualdades, fomentando o debate sobre a conquista da cidadania e as contradições presentes no modo de viver no sistema capitalista em curso na nossa sociedade.