Pela estruturação de equipe no TJ

Como forma de propor solução ao problema das requisições do Poder Judiciário a profissionais que trabalham na Política de Assistência Social, em especial psicólogos/as e assistentes sociais para elaboração de pareceres para subsidiar decisões judiciais, e com o objetivo de mobilizar entidades para a luta pela estruturação de equipes multidisciplinares, o CRESS/PR publica a seguir a CARTA ABERTA PELA EFETIVA E ADEQUADA ESTRUTURAÇÃO DAS EQUIPES MULTIDISCIPLINARES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ.
A carta é de livre reprodução. Além da carta, circula também uma abaixo assinado que pode ser acessado aqui.

 

CARTA ABERTA PELA EFETIVA E ADEQUADA ESTRUTURAÇÃO DAS EQUIPES MULTIDISCIPLINARES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ

Embora o Estatuto da Criança e do Adolescente, promulgado em 1990, e a chamada “Lei da Adoção”, do ano de 2010, afirmem que a área da Infância e Juventude deve receber atenção prioritária do Poder Público, em 2014 ainda presenciamos a ausência de uma estrutura mínima para dar celeridade aos processos que envolvem este público.

O artigo 150 do ECA prevê destinação orçamentária do Poder Judiciário para manutenção de equipe multiprofissional destinada a assessorar a justiça da infância e juventude, elaborando relatórios e pareceres que subsidiem as decisões judiciais. No entanto, a estruturação destas equipes com profissionais assistentes sociais, psicólogos e pedagogos ainda não é uma realidade no estado do Paraná. Algumas comarcas não contam com nenhum profissional da equipe de apoio, enquanto outras possuem equipes incompletas, o que impede que o trabalho realizado seja multidisciplinar.

A estruturação das equipes multidisciplinares no Tribunal de Justiça do Paraná é de fundamental importância. Estas equipes atuam na identificação e acompanhamento de situações de risco e violações de direitos de crianças e adolescentes, bem como traçam ações para restituir as condições para o desenvolvimento infanto-juvenil nas ações de medidas de proteção. Os profissionais das equipes multidisciplinares ainda acompanham as crianças e adolescentes que estão nas instituições de acolhimento; buscando a reaproximação destas crianças com a família de origem; emitem relatórios sobre processos que envolvem destituição do poder familiar e procuram promover a articulação entre o Poder Judiciário e os serviços do Poder Executivo. Além disso, as equipes atuam nos processos de adoção, realizando a avaliação e preparação dos interessados em adotar, tanto no que se refere às questões jurídicas quanto aos aspectos sociais e psicológicos.

Da mesma forma, as equipes multidisciplinares atuam na avaliação dos adolescentes que cometeram atos infracionais e poderão vir a cumprir medidas socioeducativas. Estes são processos de grande complexidade, que exigem dos profissionais o conhecimento do contexto em que o ato foi praticado, as condições de vida e as relações familiares, o acesso do adolescente aos direitos, assim como as condições deste de compreender as implicações de seu ato.

A avaliação de todas estas situações precisa ocorrer de forma qualificada e em curto período de tempo, uma vez que as crianças e adolescentes estão em fase de desenvolvimento. A ausência de respostas pode representar a ausência de proteção às crianças e aos adolescentes, a continuidade das situações de violação de direitos e a ausência de responsabilização dos adolescentes quando estes cometem algum prejuízo a pessoas, a comunidade e a sociedade.

Além da qualidade e da agilidade na realização da avaliação de cada situação, um único processo pode requere mais de uma avaliação e um acompanhamento continuado. A atuação das equipes multidisciplinares é fundamental em situações em que as relações promovidas pelos adultos se tornam complexas e passam a envolver as crianças e adolescentes, como são os casos de disputa de guarda e demais conflitos familiares. Somente com equipes próprias, que acompanhem o andamento processual, é possível acolher as demandas que chegam ao Poder Judiciário de forma a evitar que os motivos dos conflitos sejam compreendidos e não se transformem em prejuízos às crianças e adolescentes.

Cabe salientar que o trabalho das equipes multiprofissionais no Poder Judiciário pode ser caracterizado por uma especificidade, que é a de produzir um documento com uma opinião técnica autônoma, visando sempre o melhor interesse da criança e do adolescente. Esta opinião técnica poderá ser acolhida pelo magistrado, causando impactos positivos ou negativos na vida de uma família. Deste modo, é importante que os profissionais envolvidos componham o quadro próprio do Poder Judiciário.

Neste sentido, no mês de abril de 2014, o Conselho Nacional de Justiça publicou o Provimento 36/2014, que determinava aos Tribunais de Justiça a implantação, em noventa dias, das equipes multidisciplinares nas Comarcas em que já existe Vara da Infância e Juventude. Nas comarcas em que não há Vara exclusiva para a matéria da Infância e Juventude, o provimento determinou que estas deveriam apresentar, também em noventa dias, plano de metas para o provimento das equipes de multidisciplinares. Entretanto, até o momento, mesmo nas Varas de Infância e Juventude já estruturadas ainda faltam profissionais.

Temos observado que, diante da ausência de equipes próprias, o Poder Judiciário vem requisitando aos profissionais trabalham na Política de Assistência Social, em especial os psicólogos e assistentes sociais que trabalham nos CRAS e nos CREAS, a realização de relatórios e pareceres para subsidiar decisões judiciais, por vezes sob a ameaça de responder por crime de desobediência caso se contraponham ao cumprimento da avaliação. Tal ação é problemática pois, além de requisitar um trabalho de profissionais que não estão sendo remunerados para tal atividade e de aumentar a carga de trabalho das equipes profissionais, a atuação interfere em pontos importantes que embasam o trabalho dos serviços sócio-assistenciais.

A Política de Assistência Social incorporou recentemente o papel de trabalhar para fortalecer a função protetiva das famílias e prevenir a ruptura dos vínculos familiares e comunitários, promovendo o acesso e o usufruto de seus direitos, prevenindo e protegendo seus membros de situações de risco, de violência e violação de direitos. Para a realização deste trabalho é imprescindível o estabelecimento de vínculos de confiança entre os usuários e os profissionais. A realização do trabalho social, portanto, não pode ser confundido com um trabalho de perícia ou avaliação técnica para um terceiro, mesmo que este seja o Poder Judiciário. A obrigação dos profissionais em realizar este tipo de avaliação pode acarretar na perda de vínculo do usuário com os serviços sócio-assistenciais, que são mecanismos importantes de proteção e garantia de direitos.

Realizar uma avaliação técnica sendo profissional dos serviços sócio-assistenciais significa aceitar o conflito de atribuições como algo normal, quando não o é. No Sistema de Justiça por exemplo, um único profissional não pode atuar como Defensor, Promotor e Juiz de Direito, pelo simples motivo que ele não poderia defender, acusar e julgar ao mesmo tempo: isso seria uma afronta a democracia. Do mesmo modo, os profissionais da Assistência Social – assistentes sociais, psicólogos e pedagogos, não podem oferecer proteção social se se dispuserem a ocupar o lugar de avaliadores forenses: tal situação se configuraria em um desmonte do Sistema de Proteção Social.

Neste sentido, é fundamental o envolvimento da população e de suas entidades na defesa da estruturação das equipes multidisciplinares do Poder Judiciário do Estado do Paraná, compreendendo que o trabalho multidisciplinar é um passo imprescindível para assegurar a prestação de serviços de qualidade, assim como um importante meio de defesa dos direitos dos cidadãos.

Por todo o exposto, exigimos respostas do Tribunal de Justiça do Paraná, quanto a estruturação efetiva e adequada das equipes multidisciplinares próprias.

Assinam este documento:

CRESS 11ª Região
CRP PR
SINDIPSY
SINDIJUS