O CRESS/PR divulga a seguir Nota de repúdio ao anúncio de ações de internação involuntária e compulsória no estado de São Paulo, do Centro Nacional de Defesa de Direitos Humanos da População em Situação de Rua e Catadores de Materiais Recicláveis – CNDDH:
O Centro Nacional de Defesa de Direitos Humanos da População em Situação de Rua e Catadores de Materiais Recicláveis – CNDDH recebeu, na primeira semana de janeiro de 2013, solicitação de assistência jurídica do Movimento Nacional da População em Situação de Rua e do Núcleo de Defesa de Direitos Humanos da População em Situação de Rua e Catadores de São Paulo, tendo em vista o anúncio feito pelo Governador de São Paulo, Sr. Geraldo Alckmin, sobre a internação involuntária de dependentes do crack. Sendo que tal ação se dará sem a observância das garantias constitucionais, da legislação internacional sobre direitos humanos e os princípios da legalidade, do devido processo legal, da dignidade da pessoa humana e da ética.
Conforme informações divulgadas pelo governo estadual, o Estado de São Paulo passará a fazer internações involuntárias e compulsórias de dependentes do crack, sem a necessidade do consentimento do usuário, ações essas já programadas para começar no dia 14 de janeiro de 2013.
Trata-se uma ameaça à cidadania, à dignidade da pessoa humana e aos direitos fundamentais da inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade e à segurança, todos garantidos na Constituição brasileira.
O problema das drogas é uma questão de saúde pública e este direito à saúde é um direito social, fundamental, inalienável e indisponível (art. 6º da CF/88) que implica em consequências práticas, sobretudo no que tange à efetividade, com a materialização em políticas públicas eficazes, o que não tem sido apresentado em São Paulo com relação aos usuários de drogas. Destacamos o comunicado da Defensoria Pública de São Paulo de 29/08/2011, referente ao Projeto de Lei nº 673/11 que trata da internação compulsória de crianças e adolescentes usuários de drogas, que em nota relatou que São Paulo, com 645 Municípios, possui apenas 58 Centros de Atenção Psicossocial de Álcool e Droga – CAPS-AD e 216 Centros de Referência Especializados de Assistência Social – CREAS, ou seja, números insuficientes para o atendimento em todo o estado.
Consequentemente, verifica-se a falta de investimento na estrutura social para a população adulta em situação de rua, especialmente nos centros especializados de atenção ao álcool e drogas, CAPS AD, CREAS – Centros de Referência Especializados em Assistência Social e Centros de Referência para a População em Situação de Rua – CREAS-POP, estruturas fundamentais aos cuidados e de prevenção ao uso de drogas.
A Lei 10.216 de 2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, determina que a internação se proceda mediante laudo médico circunstanciado, que identifique com elementos técnico-científicos os seus motivos, e que a internação compulsória seja determinada pelo juiz competente, de acordo com a legislação vigente (art. 3° da lei 10.216 de 2001).
A determinação judicial a que se refere a lei 10.216/2001 não exime o juiz de respeitar o devido processo legal-constitucional, com todas as suas garantias, instruções probatórias e prazos e, além disto, por se tratar de uma medida de privação de liberdade, decisão mais drástica que pode tomar um juiz, deve-se esgotar todas as possibilidades de tratamento extra hospitalares, com políticas públicas na área da saúde, da moradia, do trabalho, da assistência a família e/ou responsáveis, do contato com as instituições de defesa de direitos humanos dentre outras providências garantidoras da dignidade da pessoa humana.
Políticas emergenciais de internação involuntária e compulsória caminham na mesma lógica dos modelos repudiados desde a década de 40 do século XX, rejeitados pela luta antimanicomial e pela reforma psiquiátrica, que demonstraram a ineficácia do sistema de segregação em equipamentos sociais fechados, que representavam espaços de reclusão, miséria e reprodução da violência. A aplicação de medidas já repudiadas e afastadas da prática de atendimento à saúde representa uma violação ao princípio do não retrocesso, garantido pelos princípios gerais dos Direitos Humanos.
Alternativas como especial atenção no investimento da política de saúde desde a sua atenção básica até o atendimento às necessidades específicas, serviços de Urgência (SAMU), serviços de atendimento pós-alta hospitalar, pelos Centros de Convivência, Centros de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas (CAPS – AD), pelos Consultórios de Rua e práticas de Redução de Danos, sendo que todos estes serviços devem ser oferecidos de maneira contínua e eficaz; criação de comitês para estudo, pesquisa, análise e proposição de políticas públicas sobre a questão das drogas e suas consequências; promoção de campanha preventiva e educativa sobre as drogas; fiscalização e conhecimento das comunidades terapêuticas, tornando públicas as comunidades e/ou clínicas conveniadas com o governo; implementação e execução da política pública para a população em situação de rua nos termos do Decreto Federal 7.053/09, que devem preceder qualquer medida como a que o Governo de São Paulo pretende realizar.
O CNDDH e o Núcleo de Defesa de Direitos Humanos da População em Situação de Rua e Catadores de São Paulo repudiam esta ação do Governo de São Paulo de internação involuntária de usuários de crack e conclamam toda a sociedade para se manifestarem na defesa desta população que, de muitas maneiras, já teve seus direitos violados.
Exigimos a suspensão imediata das ações do Governo de São Paulo, na pessoa do Sr. Geraldo Alckmin, de internação compulsória e/ou involuntária de usuários de Crack e outras drogas no estado de São Paulo.
Compartilhe essa idéia, diga NÃO ao desrespeito dos Direitos Humanos desta população.
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CNDDH PSR/CMR
11 de Janeiro 2013